Biografia de Luísa Todi
Biografia de Luísa Todi
= Biografia =
LUÍSA TODI

Luísa Rosa de Aguiar nasceu a 9 de janeiro de 1753, na casa nº 49-51 da Rua de Coina (atual Rua da Brasileira), na freguesia de Nossa Senhora da Anunciada, em Setúbal, filha de Manuel José de Aguiar, professor de música e instrumentista e de Ana Joaquina de Almeida, tendo sido batizada a 31 de janeiro na Igreja Paroquial de Nossa Senhora da Anunciada.

Aos 14 anos mudou-se para Lisboa, quando seu pai passou a trabalhar como copista de orquestra no Teatro do Bairro Alto.

Com essa idade, Luísa, com a sua irmã mais velha, Cecília Rosa de Aguiar, começa a sua carreira pelo teatro musical, estreando-se, no Teatro do Conde de Soure, num pequeno papel do Tartufo, de Moliére, enquanto a sua irmã tinha o papel principal.

Em 28 de julho de 1769 casou, na Igreja Paroquial das Mercês, com o compositor e primeiro violinista napolitano Francesco Saverio Todi.

Francesco Todi dá-lhe o apelido e fê-la aprender canto com o conceituado mestre capela da corte portuguesa, David Perez, sendo o grande responsável pelo seu aperfeiçoamento e a dimensão internacional que a levaram a todas as cortes da Europa como cantora lírica.

Depois de um período de 6 anos a residir no Porto, com a preparação obtida por intensas aulas de canto e várias acuações, inicia a sua carreira fora do País.

Primeiro em Londres, ainda algo imatura e com um sucesso muito limitado, mas depois por Espanha e Paris onde triunfa.

Aí, em Paris, participa nos Concertos Espirituais, que se realizavam regularmente no Palácio das Tulherias e logo na sua primeira apresentação causa uma impressão tal que a notícia se espalha como fogo na alta sociedade francesa, que acorre em massa às récitas seguintes que se esgotam imediatamente. Passa igualmente a ser presença regular em Versalhes onde faz os chamados Concertos da Rainha.

Luísa Todi, nessa altura, começa a receber convites irrecusáveis de toda a parte e o empresário dos Concertos Espirituais, para a prender, cria um fenómeno de diversão, que depois veio a ser utilizado futuramente para promover a popularidade de outras cantoras: convida para os seus Concertos Espirituais a grande cantora alemã Gertrude Elisabeth Mara. Simultaneamente, com esse convite, põe a circular o boato de que existe uma enorme rivalidade entre ambas e fá-las atuar alternadamente nos seus Concertos. O público acorre em avalanche, os críticos apenas sabem dizer que ambas são magníficas e chegam a formar-se dois partidos, Os Todistas e Os Maritistas.

O assunto torna-se o principal tema de debate nos salões da capital francesa. No final, Luísa Todi acaba por vir a ser considerada pelos franceses como “A Cantora da Nação”.

Contudo, Paris e Itália, onde também atuava regularmente, já não chegavam para Luísa Todi que, sendo uma admiradora da Imperatriz Catarina II da Rússia, parte para aquele país, mesmo sem ter contrato, bastando-lhe a palavra do diretor dos Teatros Russos, de que poderia fazer dois espetáculos para a Imperatriz.

Diz-se que o espetáculo de despedida de Paris foi um acontecimento nunca visto e não mais repetido. Houve uma loucura coletiva na aquisição dos ingressos, que atingiram preços astronómicos e no final da sua apresentação, com as flores e os presentes recebidos (entre os quais inúmeras joias), Luísa Todi encheu completamente duas salas.

A sua estadia em São Petersburgo foi também um sucesso (as duas récitas inicialmente previstas transformaram-se em quatro anos de permanência), mas foi um sucesso algo atribulado! Logo após o primeiro espetáculo, Catarina II ficou tão impressionada, que nomeou Todi professora de canto das princesas imperiais criando a inimizade do até então conselheiro musical da corte russa, o compositor italiano Giuseppi Sarti.

Para tentar desmoralizar Todi junto da Imperatriz, Sarti teve a ideia de chamar à Rússia o castrati mais famoso da época, chamado Marchesi, que foi considerado o sucessor do grande Farinelli. A ideia era colocar os dois lado a lado, de forma a que o famoso Il Marchesino, como era chamado o cantor, fizesse sombra a Luísa Todi numa Ópera do próprio Sarti. No entanto, o que Sarti conseguiu foi uma récita extraordinária e tanto Catarina, como toda a Corte, acabaram por ficar deslumbrados com os dois cantores e até com o próprio compositor.

Luísa Todi e seu marido partem depois rumo à Alemanha e a França. Em Bona é homenageada com uma atuação pelo jovem pianista Ludwig van Beethoven e após uma temporada em Paris e novas acuações na Alemanha instala-se em Veneza, com um contrato no Teatro San Samuele.

Logo na sua primeira récita começa por deixar boquiaberta a assistência ao apresentar-se em palco com as jóias, colar e tiara que lhe haviam sido oferecidos por Catarina da Rússia, mas mais surpreendidos ficaram todos os presentes, assim que começou a cantar, fazendo de imediato com que público e a crítica se rendessem completamente à sua voz, de tal modo que a temporada lírica italiana de 1790-1791 ficou conhecida como "o Ano da Todi".

Durante essa estadia em Veneza, a saúde dos seus olhos deteriora-se gravemente, vendo-se obrigada a interromper as atuações para enorme consternação do público. No seu regresso ao teatro, são os próprios admiradores que o decoram e iluminam, e ao entrar em cena tem todo o público de pé, emocionado, num aplauso que parecia não mais acabar.

Para essa récita, houve tanta gente a querer ouvir Luísa, que o Teatro teve de ficar de portas abertas para que pudesse ser ouvida no largo fronteiro e nas ruas laterais, onde foi escutada em religioso silêncio.

Atua ainda noutras cidades italianas e em Madrid, até que regressa ao Porto onde atua até aos 50 anos, altura em que o marido morre e ela deixa de cantar, passando a vestir, para sempre, luto carregado.

Seis anos mais tarde, aquando das invasões napoleónicas, Luísa e as filhas, seguindo a restante população do Porto, fogem e, enquanto se dá o desastre da Ponte da Barcas, Luísa cai ao rio, do barco onde estava, levando com ela um saco com todo o seu dinheiro e a maior parte das suas joias.

A sua criada estende-lhe um remo do barco, Luísa salva-se, mas perde no Douro todos os haveres que transportava. Restam-lhe algumas joias que ficaram em poder duma filha, entretanto ferida a tiro pelos soldados invasores.

Este ferimento não permitiu que continuassem a fuga e Luísa, as filhas e a criada resolvem entregar-se aos franceses. Mas é o próprio General Soult que, ao vê-la, reconhece-a como a “Cantora da Nação” e toma-a sob a sua própria proteção pessoal.

Pouco tempo depois Luísa parte para Lisboa, onde viverá o resto dos seus dias.

As poucas joias que lhe sobraram dão-lhe para se instalar numa casa modesta no Bairro Alto, numa Rua que hoje tem o seu nome, e para poder comer.

Esquecida pelo público português, tem de vez em quando visitas dos seus amigos estrangeiros, que gostam de a rever. A pouco e pouco, também esses irão desaparecer.

Aos 60 anos perde a visão de um dos olhos e, 9 anos depois, ficará totalmente cega.
E é assim, só, pobre e na escuridão que esta mulher que já convivera com as personalidades mais importantes do mundo, termina os seus dias. Tem 80 anos quando morre em Lisboa, sendo sepultada no cemitério então adjacente à Igreja da Encarnação ao Chiado.

Diz-se que terá sido enterrada sem identificação, mas parece que não é bem assim, sendo interessante transcrever o que foi dito, a este propósito, pelo biografo da artista, o Dr. Mário Moreau:

“A zona da igreja onde Luísa Todi foi sepultada deixou, mais tarde, de fazer parte do templo e veio a ser ocupada por uma chapelaria que teve o nº 78 da Rua do Alecrim.

Diversos autores têm escrito que a cantora foi sepultada sem qualquer indicação do local.
Há, porém, razões para supor que tal não corresponda à verdade. De facto, o jornal República publicou um artigo em que se menciona uma afirmação do então dono da referida chapelaria.

Esse senhor, de nome Artur Santos, declarou perentoriamente ter visto, durante umas obras de levantamento do soalho da loja, a pedra tumular de Luísa Todi. A inscrição estava um pouco sumida, mas não tanto que não permitisse ver nitidamente o nome da cantora.

Foi ainda o referido comerciante quem conseguiu evitar que um dos operários destruísse a pedra com uma picareta. Na época ainda se esboçou a ideia de recuperar a pedra tumular e de dar à grande artista uma sepultura condigna. Mas, como já seria de esperar, nada se fez nesse sentido.

Por nossa parte, entendemos que os fins em vista continuam a justificar amplamente as necessárias pesquisas, por pouco provável que alguém possa considerar o bom êxito do empreendimento e sejam quais forem as objeções que se possam levantar. Em qualquer país que prezasse devidamente os seus maiores vultos já há muito se teria realizado tal tarefa. Na nossa terra, porém, até agora não se conseguiu muito mais do que um sorriso irónico e um encolher de ombros.

Isso não nos impede de renovar aqui a pergunta já feita na República há mais de sessenta e quatro anos: estará a Câmara Municipal de Lisboa interessada na recuperação da pedra tumular de Luísa Todi e em dar à nossa grande artista a sepultura que ela merece?”